Sucessão do cônjuge vista pelo STJ

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ZENO VELOSO
Jurista 

A Escola  Superior  da  Advocacia - ESA, da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo, está promovendo um curso, denominado “Grandes Temas de Direito de Família e Sucessões”, organizado pela professora e advogada Viviane Girardi, que atualmente faz especialização em Direito Civil na Universidade de Camerino, na Itália.

Viviane convidou-me para participar do curso da ESA, e ela também vai dar uma aula no mesmo. Atuam no evento outros professores, de várias partes do país, como Francisco José Loureiro, João Aguirre, Antonio Carlos Coltro, Rolf Madaleno, Gustavo Tepedino e Rodrigo da Cunha Pereira. 

Tepedino, um dos maiores civilistas brasileiros, acaba de ingressar na Academia Brasileira de Letras Jurídicas, com sede no Rio de Janeiro, e me convidou para fazer o discurso de recepção dele. Rodrigo é o nosso eminente presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM, que realizará, dias 13 a 16 de novembro, em Belo Horizonte, Minas Gerais, o VII Congresso Brasileiro de Direito de Família, e quem quiser obter mais informações, basta acionar o site ibdfam@adventocongressos.com.br.

Voltando ao curso da ESA, estive lá, semana passada, e dividi o módulo com o professor Rolf Madaleno, do Rio Grande do Sul, autor do “Curso de Direito de Família”, publicado pela Forense, que já está na 4ª edição, uma obra fundamental, grandiosa, com mais de 1.000 páginas. Rolf falou sobre a importante figura da desconsideração da personalidade jurídica (“disregard doctrine”) aplicada às relações familiares. Quando, por exemplo, o sócio cônjuge ou convivente, com abuso de direito, fraude, trapaça, velhacaria, subtrai, esconde ou desvia bens do casamento, deslocando-se para o patrimônio da empresa, ou fazendo com que os bens da empresa sejam reduzidos a um valor irrisório, insignificante, tudo para escapar ao cumprimento de obrigações, incluindo deveres familiares, como pagamento de pensão alimentícia, de indenizações, de composição da partilha, de divisão de bens etc., a manobra ardilosa e sibilina pode ser desfeita com a desconsideração da personalidade jurídica, recompondose o patrimônio dilapidado. A matéria está prevista no art. 50 do Código Civil, e Rolf Madaleno acentua sempre que uma das obras pioneiras a respeito do tema é da professora paraense Suzy Elizabeth Cavalcante Koury.

No citado curso da ESA, que é presencial e, igualmente, gravado e retransmitido, falei sobre o direito hereditário do cônjuge e do companheiro, que é o título, por sinal, de meu livro sobre a matéria, recentemente publicado pela Editora Saraiva -SP. A respeito da sucessão entre os conviventes, partícipes da união estável, que é regulada no art. 1.790 do Código Civi l, opinei que as regras são passadistas, discriminatórias, enfermadas de notória inconstitucionalidade, o que já foi declarado por alguns tribunais estaduais e, no momento, está sendo julgado pelo Órgão Especial do Superior Tribunal de Justiça- STJ.

Quanto à sucessão entre os cônjuges, mostrei que a regra é o cônjuge sobrevivente concorrer com os descendentes do falecido, mas o art. 1.829, inciso I, do Código Civil abre tantas exceções que o preceito, afinal, acaba virando exceção, tornando o princípio um paradoxo. Assim, depois de proclamar a concorrência entre os descendentes do autor da herança com a viúva ou o viúvo, o aludido art. 1.829, inciso I, diz que a concorrência, todavia, não ocorrerá, se o regime do casamento foi o da comunhão universal, da separação obrigatória (nos casos previstos no art. 1.641), ou o da comunhão parcial (a não ser que o falecido tenha deixado bens particulares). O problema já não estava bem resolvido, e veio receber um fator de complicação com uma decisão tomada pela 3ª turma do STJ, relatora Ministra Nancy Andrighi, no Recurso Especial nº 992749/MS, afirmando-se que no regime da separação convencional de bens, celebrada por meio de pacto antenupcial (escritura pública), não ocorre, igualmente, a concorrência sucessória entre o cônjuge sobrevivente e descendentes do falecido, enquanto que, na redação do Código Civil, há, sim, essa concorrência, se o regime foi o da separação convencional. Esta decisão judicial, inovando o que dispõe o art. 1.829, inciso I, do Código Civil, e que nenhum operador do direito pode desconhecer ou deixar de levar em consideração, acabou trazendo um elemento de insegurança e perplexidade com relação ao tema, que já não era pacífico e simples. Minha oposição à tese abraçada pelo STJ é puramente doutrinária, exclusivamente acadê- mica, não ficando diminuída minha admiração pela Ministra Nancy, magistrada honesta, exemplar, jurista de grande mérito.

18.02.2012 

Fonte: Publicado no jornal "O Liberal" -  22.10.2011 

                        LEI No 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002
 Institui o Código Civil

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:

I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;

II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;

III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;

IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.

Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento:

I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento;

II – da pessoa maior de 70 (setenta) anos; Redação da LEI Nº 12.344/9.12.2010.

(Redação anterior) - II - da pessoa maior de sessenta anos;

III - de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III - ao cônjuge sobrevivente;

IV - aos colaterais.

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