RIQUEZA  VAI  POBREZA  FICA  

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Zeno Veloso
Jurista

   Muito se tem falado e escrito sobre o drama por que passam os Estados que possuem recursos minerais, cuja exploração é feita nos moldes mais perversos do capitalismo selvagem. O Pará, por exemplo, é uma das regiões mais ricas e dadivosas, não só do Brasil, mas do planeta, e, paradoxalmente, seu índice de progresso e desenvolvimento ainda é baixo, apresentando imensa parte da população vivendo aquém da linha da pobreza. Só não se morre de fome porque a natureza é dadivosa, e os rios dão os peixes e as árvores os frutos para encher a barriga de tanta gente sofrida.

Lembro-me da angústia do ex-governador Aloysio da Costa Chaves, afirmando que “tinha de tirar água de pedra” para atender os pleitos das novas concentrações urbanas que se abriam no Pará, fruto da emigração desordenada, com a atração dos grandes projetos aqui sediados. De um momento para o outro, em locais onde não havia nada e coisa alguma, construíam-se casas (ou casebres), nasciam crianças, apresentavam-se graves problemas de segurança pública, educação, saúde e outras necessidades básicas. E chegava ao Lauro Sodré, a cada dia, uma montanha de requerimentos da Assembléia Legislativa e de outros setores pedindo providências, atenção, investimentos, obras. Os governadores que sucederam ao professor Aloysio passaram pelas mesmas dificuldades.

Estive, semana passada, no Amapá, de onde sou cidadão honorário, e lá o que sobrou de projetos de exploração mineral foi o caos, a pobreza social, a calamidade. Para onde foi tanto dinheiro? Que bolsos felizes embolsaram tanta grana? Que gente enriqueceu com tudo aquilo que se tirou do Amapá?

Aqui, não tem sido diferente. Levam-se milhões e, quando deixam alguma coisa, são migalhas. Os “buracos da Palmeira” se multiplicam, aos milhares. Há anos e anos isso tem sido denunciado, exaustivamente, cansativamente. Nada explica ou justifica o descaso histórico do Governo Federal, desde José Sarney, com o Pará. Em Santarém, para quem quiser ver, exibe-se uma fita de vídeo na qual Fernando Henrique, em duas campanhas eleitorais sucessivas, dizia e jurava que não sairia da Presidência sem que deixasse asfaltada a Santarém-Cuiabá. Nem vou comentar o que aconteceu (ou o que não aconteceu), porque todo mundo sabe.

Temos de dar um jeito nisso, lutar com todas as forças para que esse estágio de quase escravidão deixe de nos atormentar. Em poucos lugares do mundo - mesmo considerando os do centro da África - os desníveis sociais são tão gritantes, a disparidade econômica tão cruel.

Todos proclamam - inclusive fora daqui - que a Constituição do Pará, de 1989, foi uma das mais avançadas dentre todas as que se fizeram pelo Brasil, na época da reconstrução democrática. E o constituinte paraense não deixou de estar preocupado com o problema da exploração mineral. O artigo 44 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da Constituição Federal de 1988 menciona as empresas brasileiras titulares de autorização de pesquisa, concessão de lavra de recursos minerais e de aproveitamento dos potenciais de energia hidráulica, prevendo que elas cumpram alguns requisitos. Pois o artigo 332 da Constituição do Pará afirma que, ressalvadas as disposições de interesse nacional, constitucionalmente previstas, tais empresas só poderão receber aprovação e licenciamento dos órgãos estaduais competentes, quando atenderem aos princípios gerais estabelecidos na Constituição paraense “e industrializarem, dentro dos limites do Estado, os bens minerais aqui extraídos, na forma da Lei”(faço questão de transcrever com destaque).

Ninguém parece querer cumprir com os seus deveres mínimos para com nosso Estado e nosso povo, quando daqui carregam os recursos e reservas minerais que existem em nosso território, ficando a herança maldita da devastação. Só porque os recursos minerais do subsolo pertencem à União, quem vive no solo tem de ser discriminado, penalizado, excluído? Que República é esta? Que Federação é esta? Vamos nós, paraenses, pelo menos, cumprir e fazer cumprir o que prevê o artigo 332 da carta estadual. Alguém pode achar que este artigo é inconstitucional. É a uma simples opinião, e opinião todo mundo pode dar. Só quem tem autoridade para afirmar, em caráter definitivo, que uma norma é inconstitucional é o Supremo Tribunal Federal.

10.01.2008

Fonte:    Jornal "O Liberal" - 13.09.2003

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