Independência funcional do Juiz

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Antonio Sbano
Magistrado aposentando 

                         Após a criação do CNJ, uma verdadeira febre de denúncias tomou conta da comunidade forense e, até, de integrantes de Poderes da República, querendo transmutar aquele Órgão de mero fiscal externo do Poder Judiciário em sensor, crítico e julgador das decisões judiciais, um verdadeiro absurdo a por em risco as atividades jurisdicionais, ferindo comando constitucional quanto a independência do magistrado para decidir.

Decisão judicial boa ou má ou seja lá o que for, só pode ser atacada por via recursal. Mas, o que se vê hoje é a contagiante onde de “policiar” o pensamento do juiz.

Assim é que se tem notícias de Câmaras que estão remetendo para a Corregedoria de Justiça sentenças reformadas, pelo simples fato do julgador colegiado ter entendimento diverso do magistrado de primeiro grau.

Dias passados, a Juíza Andréa Pachá falou à imprensa sobre a conduta do Juiz de Sete Lagoas (MG) que deixou de aplicar a Lei Maria da Penha por entendê-la inconstitucional, argumentando que estudaria a possibilidade, ou não, de processar administrativamente o magistrado para aferir o grau de qualidade de sua sentença, sob argumento de uso inadequado da linguagem. Com todas as vênias, ao CNJ não cabe tal mister. Se o magistrado se exasperou em seu linguajar, mas o fez para sustentar seu ponto de vista, quando muito e, ainda assim vejo com reservas o poder de censura, caberia ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais através de seu órgão de 2º Grau, se instado por recurso pertinente, agir em relação ao magistrado apenas para determinar moderação de seu linguajar, nunca para avaliar a qualidade do trabalho ou criticá-lo ou puni-lo pelo entendimento doutrinário esposado.

Agir  como órgão controlador de uma hipotética capacidade funcional é dizer que o Tribunal foi incompetente na seleção!

Aliás, a ilustre magistrada conselheira deve ser dar por impedida, eis que violou o recém editado Código de Ética da Magistratura, e que é lavra do próprio CNJ,  ao se manifestar sobre processo que está sob sua apreciação.

Não é raro no dia a dia forense, advogados e partes, irresignados com a decisão, vociferar que irão ao CNJ contra o juiz, deixando ao largo a via recursal pertinente.

Mas, não é só! Ao tempo em que se criticou o ilegal grampo no telefone do Min.Gilmar Mendes, não se pode deixar de registrar o motivo da ligação do Ilustre Senador: queria buscar meios para reclamar contra um magistrado que proferira decisão de seu desagrado afirmando que, se solução negociável não encontrasse, iria apresentar reclamação ao CNJ.

Em suma, tenta-se amordaçar a magistratura brasileira com súmulas vinculantes, uma verdadeira barreira para a evolução do direito; ameaça-se o magistrado com sucessivos processos disciplinares, tomando-lhe tempo para responder a procedimentos natimortos em razão das aberrações contidas, mas recebidos e levados à instrução. A única coisa que não se busca é a oferta de condições dignas de trabalho ou se o faz de forma meramente secundária. 

Se a verdadeira caça as bruxas (juiz usa toga, capa preta, que não se assemelha à capa das vestutas e horripilantes senhoras dos contos místicos) continuar a tomar corpo, em breve, os Ministros do STJ também serão alvos de ação sensorial e qualitativa da sanha inquisitória, sempre que uma decisão sua for modificada!

Os limites de ação disciplinar dos tribunais e do CNJ são os encartados na constituição, não se podendo admitir, sob qualquer argumento que seja,  se venha a tolher e limitar poder de decisão do juiz, adstrito apenas à lei e ao seu convencimento.

Interpretação da norma legal jamais poderá ser focada como  incapacidade, incompetência ou despreparo do juiz, eis que, se assim for, todo pensamento diverso do juiz também deverá ser visto como estapafúrdio, negando-se os mais elementares e básicos princípios da ciência do direito.

Não se pode comungar com a idéia de que um órgão fiscal externo se intrometa, como querem alguns, na prestação jurisdicional enquanto produção intelectual do juiz ou na esfera de atuação dos tribunais de justiça, substituindo-os e, no fundo usurpando suas atribuições legais. Na mesma esteira, não se pode admitir a ingerência em assuntos que não lhe dizem respeito como avaliar a qualidade da decisão judicial, poderá até fazê-lo, em tese e em controle difuso, para aprimorar as regras gerais e seletivas para o ingresso na carreira.

Rendem-se homenagens quando o CNJ disciplina assuntos de interesse geral tais como: fixação de critérios subjetivos para remoção e promoção, identificação de causas e busca de soluções para a morosidade da Justiça e quando intervêm, para sanar irregularidades ou ilegalidades cometidas pelos próprios tribunais. Essa é sua missão, jamais a de se sub-rogar na competência legal dos juízes e dos tribunais.

 

03.09.2008 

Fonte: E-mail noticias@anamages.org.br - 03.09.2008

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