Fim do troca-troca

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Zeno Veloso
Jurista

 

Caiu como um bomba nos meios políticos e jurídicos a decisão do Tribunal Superior Eleitoral de que o mandato dos deputados é dos partidos e não dos parlamentares; e o deputado que deixar a legenda pela qual foi eleito, ou seja, que trocar de partido, simplesmente perde o mandato e o suplente deve ser convocado, imediatamente, para o seu lugar.

Salvo os dirigentes partidários que estavam se beneficiando com o troca-troca, todos aplaudiram a decisão, que tem um evidente conteúdo moralizador e vem ao encontro de uma antiga aspiração. Não há político sério neste país ou cientista digno deste nome que não defenda uma reforma política séria e profunda, há anos prometida e nunca implementada. Os projetos, neste sentido, rolam e rebolam pelos gabinetes do Congresso Nacional, que não atende ao verdadeiro clamor popular.

Mais uma vez, no Brasil, como já aconteceu tantas vezes, é o Judiciário que toma a frente, assume a responsabilidade e procura resolver o velho problema, corrigir o antigo vício. Muitas legendas partidárias não significam nada e coisa alguma, funcionando somente como 'barrigas de aluguel' de políticos de oposição e que se tornam governistas num piscar de olhos. Todo mundo sabe o tipo de vantagem que essas pessoas querem obter. Salvo alguma exceção que possa existir, de modo geral, essas mudanças de legenda não têm motivos nobres ou relevantes. E acontecem em grande número, de forma abusiva, chocante. Desde as eleições de outubro, 37 deputados federais se bandearam para outra legenda. A maioria passou para o lado do governo, outros continuaram na chamada base aliada e nenhum, por coincidência (!), passou do governo para a oposição. Nenhum.

O PSDB, os Democratas (ex-PFL) e o PPS, principais partidos de oposição, já anunciaram que vão se basear na decisão do TSE para pedir a declaração da perda do mandato dos políticos que foram eleitos por eles e migraram para outras legendas. Para o lugar dos cassados, seriam convocados os suplentes. Pela decisão do TSE, isto é possível, pois foi consagrada a tese da fidelidade partidária e de que o mandato parlamentar pertence ao partido. Mas a tese sufragada no TSE precisa ainda ser confirmada pelo Supremo Tribunal Federal - STF, o que não parece difícil de ocorrer, considerando que no TSE já votaram com a tese três ministros do STF: Marco Aurélio, Carlos Brito e Cezar Peluso.

Interessante (ou patético!) é que os políticos que trocaram de lado para aderir ao governo nem contam com a solidariedade explícita dos governantes. Tanto o presidente Lula da Silva como o vice-presidente, José Alencar, elogiaram a decisão do TSE, vejam só!

Alguns juristas estão alegando que o TSE julgou para o futuro e a decisão não pode retroagir para abranger mudanças partidárias que ocorreram outrora. O argumento, todavia, não procede. O TSE não 'criou' uma lei nova - e nem podia fazê-lo; apenas interpretou uma lei antiga, a Lei dos Partidos Políticos, bem como a Constituição de 1988. Pode até acabar em 'pizza', como tanta coisa neste país, mas que a situação dos que trocaram de partido é preocupante, não há dúvida alguma. Observe-se que o veredito do TSE é vertical: vale para os deputados federais, os estaduais, distritais e vereadores.

Uma das pragas de nosso sistema é o número exagerado de partidos. Estamos diante de uma 'sopa de letras', sem o sabor das verdadeiras sopas de letras. Como disse o governador mineiro Aécio Neves, aplaudindo, também, a decisão do TSE: 'Em todo lugar do mundo os países têm dois partidos, três, no máximo. O Brasil tem 30. Não existem 30 ideologias. O que existe é língua de trapo, partido de aluguel'.

Temos de mudar este quadro doloroso e triste. Não estamos na beira do abismo, mas no fundo dele. O Congresso Nacional tem de acordar dessa letargia. Reforma política, já! Ou a saúva acaba com o Brasil.

01.04.2007 

Fonte: Jornal "O Liberal" - edição de 31.03.2007 - Belém - Pará

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