O   dever   do   advogado

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ZENO VELOSO
Jurista 

       Quarta-feira passada, dia 22 de abril, a Academia Paraense de Letras - APL, sob a presidência do professor Édson Franco, realizou uma sessão especial com o objetivo de homenagear o magno evento histórico brasileiro, que é a Inconfidência Mineira ou, mais propriamente, a Conjuração Mineira, que alguns preferem chamar Conjuração Nacional. 

O grande herói desse movimento, o mártir desse elevado momento de construção de nacionalidade, sem dúvida, foi Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.  

O orador  oficial  da  sessão  foi  o  advogado  e  acadêmico  Agildo  Monteiro,  que  é  uma  figura  respeitável,  estudioso, preparado, despido de vaidade e, simplesmente, um dos maiores pesquisadores, um dos mais profundos conhecedores, em todo o país, da vida e da obra de José de Oliveira Fagundes. E há 20 anos Agildo se dedica ao tema.  

Muitos estarão a perguntar: “E esse Fagundes, quem é?” O desconhecimento não deve causar surpresa. Sobre a memória desse homem admirável desceu o peso enorme do esquecimento e do desprezo, o que significa uma terrível injustiça. Até nos meios jurídicos ele não é homenageado, como merece. Trata-se de um símbolo da advocacia brasileira, um autêntico ícone. José de Oliveira Fagundes foi o advogado dos conjurados, o patrono de Tiradentes, e, o que é mais importante, fez um trabalho profundo, sério, corajoso. Defendeu, o quanto pôde, e até mais do que era possível, naquelas dolorosas circunstâncias, aquele grupo que já estava praticamente condenado entes de começar o julgamento. Os conjurados eram acusados do crime dos crimes, o de lesa-majestade, punido com penas severíssimas pela cruel legislação criminal do Império, que constava nas Ordenações Filipinas.  

Quem indicou e pagou o advogado para defender os nossos heróis foi a Santa Casa de Misericórdia, que, naquele tempo, tinha esse objetivo, também, de proporcionar assistência jurídica aos que dela precisavam. José de Oliveira Fagundes nasceu no Rio de Janeiro e se formou na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.Tinha uma banca respeitável e todos ficaram surpresos, até espantados, quando ele aceitou a incumbência de defender osconjurados. 

É fácil imaginar o que isso significava em termos de desafios, perigos, dificuldades e riscos: defender os tidos como traidores de um regime monárquico absolutista. Muitos devem ter dito: “acaba sendo enforcado o próprio advogado dos acusados!” Precisamos   resgatar  a  memória  do  advogado  Fagundes.  

Sua  história  precisa  ser  relembrada,  cantada,  contada  e  recontada. A Ordem dos Advogados do Brasil tem de realizar seminários, debates, concursos dirigidos a estudantes universitários, a profissionais, enfim, precisa divulgar e enaltecer o nome daquele que foi um dos maiores advogados do Brasil. 

Ao defender os conjurados que queriam libertar o país do jugo português, Fagundes se tornou um herói tão respeitável quanto eles. Outro símbolo da advocacia nacional, o grande Ruy Barbosa, teve de responder, certa vez, a uma carta que lhe enviou seu amigo e correligionário, o advogado Evaristo de Moraes, que consultava o chefe político e mestre se devia aceitar a defesa de um cidadão que estava acusado de cometer um crime passional, repugnante, estando a opinião pública revoltada com ele e, ademais, o réu era um dos mais ferrenhos adversários de Ruy e seu impiedoso crítico.  

Ruy respondeu a Evaristo afirmando que este devia, sim, fazer a defesa de quem, em momento de desespero e angústia, o havia procurado, até porque é esta a missão do advogado, afirmando o mestre: “Em princípio, a defesa é de direito para todos os acusados, não havendo crime, por mais hediondo, cujo julgamento não deva ser assistido da palavra acalmadora, ou retificadora, ou consoladora, ou atenuadora, do advogado”. Essa resposta de Ruy se transformou num livrinho precioso, com o título “O Dever do Advogado”, um clássico de ética profissional, que devia ser distribuído nas faculdades e transformar-se em leitura obrigatória - e prazerosa - de todos os que se dedicam a lutar pelo Direito e pela Justiça.

20.08.2009 

Fonte: Jornal "O Liberal" edição de 25.04.2009

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