O ADVOGADO NECESSÁRIO |
SÉRGIO
COUTO
Presidente
do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB
Os
advogados só atrapalham. São corporativistas. Essas são
expressões comuns entre pessoas que nada sabem; quando falam sobre o
que não conhecem. Na época do "terror", na Revolução
Francesa, dizia-se a mesma coisa. Os inocentes não precisam de advogado
porque são inocentes. Os culpados também não, porque são culpados,
ora bolas! Assim, a guilhotina corria solta e generosa. Napoleão
Bonaparte fechou o Barreau, a OAB francesa, e mandou cortar a língua
dos advogados que lhe faziam oposição. As atrocidades nas masmorras de
Paris se tornaram tão escandalosas que Napoleão, assustado, voltou atrás.
Reabriu o Barreau e determinou que a Coroa pagasse advogados dativos
para os presos. Hitler proibiu os judeus de serem assistidos por
advogados. Auschiwitz, Treblinka e Sobibór foram os
resultadosdamonstruosidade. Mussolini, em uma só noite, mandou
incendiar 40 escritórios de advocacia. João Figueiredo, aquele que
preferia o cheiro dos cavalos, queria alugar o Maracanã
para prender os advogados, como única forma de implantar tranquilamente
seu plano econômico. De outra forma, os advogados iriam
"melar" tudo com seus mandados de segurança. De
fato, para esses tipos, os advogados atrapalham mesmo. Esse é,
exatamente, o orgulho da advocacia: atrapalhar aqueles que querem
violentar ou se aproveitar dos mais fracos. Os que acham, por exemplo,
que os pobres empregados devem ir para a Justiça do Trabalho sem
advogado, enquanto os ricos patrões vão acompanhados de suas poderosas
assessorias juridicas. Ou aqueles outros que
querem confinar os pobres nos juizados especiais, enquanto os ricos
pagam a Justiça comum. Para esses, os advogados são mesmo uns trastes
desnecessários e incômodos. Sem
os advogados nas separações
consensuais, pergunto, quem iria redigir as complexas cláusulas de
separação, que incluem
partilha de bens, ainda que insignificantes; a regulamentação da
guarda dos filhos; o direito de visita; as modificações dos nomes; os
alimentos; os aspectos tributários envolvidos, e outras tantas obrigações
recíprocas que remanescem? O notário? Se for, a idéia não passa de
um truque: é "trocar seis por meia dúzia". Tira-se o
advogado e se coloca o notário. Ou seja, os notários passam a exercer
as prerrogativas profissionais próprias dos advogados, que freqüentaram
a universidade para se prepararem profissionalmente para desempenhar
essa missão. Os
notários, nesse cenário, iriam reunir as partes em seus gabinetes;
aconselhá-las; discutir as clásulas e condições da separação;
redigir as minutas dos acordos; estudar as implicações fiscais
oriundas da separação. Depois, eles mesmos lavrariam as escrituras
correspondentes, mandariam para os registros decorrentes etc. Quem os
controlaria? Quem discutiria com eles tais ou quais aspectos especiais? Ou
se poderia fazer diferente: o casal mesmo poderia combinar a separação
sem a presença dos advogados. Dentro de Um "clima" de grande
civilidade, como é rotina entre os nobres dos países nórdicos. Só
que esse "clima" não é comum nas favelas. Nem nos bairros da
periferia das grandes cidades brasileiras. Aqui, é mais comum a separações
serem "combinadas" na base "da porrada", do que na
base da educação. Nessa realidade, descartar o advogado redundaria,
inapelaveImente, na submissão da parte mais fraca (de regra, a mulher,
economicamente hipossuficiente) à mais forte (o macho provedor). Como disse Churchill (foi ele mesmo?) "a democracia não é o melhor dos regimes. Mas ainda não se inventou nada melhor". Digo eu: "os advogados podem até atrapalhar. Mas são indispensáveis à administração da Justiça". Assim está na Constituição. 05.03.2007 |
Fonte: Jornal "O Liberal" - Belém - Pará - Edição de 03.03.2007 |
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