Adultério e indenização por dano moral

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Zeno Veloso
Jurista

Recebi pelos Correios, mês passado, dois excelentes livros, que recomendo aos estudantes e operadores do Direito. O primeiro é o Curso de Direito Civil, volume 2 – Direito de Família, do saudoso professor Washington de Barros Monteiro, editora Saraiva, já na 39ª edição, e, a partir da mesma, com a co-autoria de Regina Beatriz Tavares da Silva. O outro foi enviado de Curitiba pelo autor, Inácio de Carvalho Neto, e se intitula Responsabilidade Civil no Direito de Família, editora Juruá, 3ª edição.

Tanto Regina quanto Inácio defendem a tese de que ocorrendo o descumprimento do dever conjugal, caracterizando-se adultério, apresentam-se os pressupostos da responsabilidade civil, conforme dispõe o artigo 927 do Código Civil, podendo o cônjuge enganado pedir indenização, alegando dano moral. 

Regina, que, além de culta, é uma das mais belas professoras de Direito de São Paulo, chega a argumentar: se um acidente de trânsito, mesmo que provoque um pequeno prejuízo, gera ao culpado o dever de repará-lo, se o extravio de bagagem em transporte aéreo enseja a indenização pelos prejuízos até mesmo morais ocasionados ao passageiro, não há qualquer motivo que impeça a indenização por danos morais e materiais ocasionados por infração a dever do casamento.

Participei, recentemente, do III Congresso Paulista de Direito de Família, organizado pelo mestre Euclides de Oliveira, e conversei sobre o tema com o professor Flávio Tartuce, jovem e vitoriosa expressão de jurista, que transmitiu sua opinião de que a quebra da fidelidade, por si só, não gera o dever de reparar danos. 

A consequência da prática do adultério, com a ruptura da vida em comum, somente possibilita a separação do casal. Mas se o adultério vem acompanhado de violência física ou moral, de propalação do fato, desmoralizando, humilhando, denegrindo a imagem da vítima, diante de terceiros e dos próprios filhos, já se trata de ilícito e haverá responsabilidade pelo dano moral.

Fora do caso de adultério, a quebra de alguns deveres conjugais, só pelo fato, em si, como atentado contra a vida, sevícia, maus-tratos, transmissão de doença através do relacionamento sexual (DSTs), caracteriza a responsabilidade e o dano moral é indenizável.

Semana passada, contei o sucedido com um marido traído que deseja pedir indenização do amante de sua esposa, alegando que este praticou um ato repulsivo, que causou humilhação, imenso sofrimento e dor pungente à vítima do adultério. 

A própria advogada do tal marido enganado ficou espantada com os seus argumentos, inclusive de que “quem usa tem de pagar o aluguel”, e que não ingressava com ação contra a esposa adúltera porque esta é “dura” e o “ricardão”, abastado. 

Para espancar dúvidas e suspeitas, esclareço que o fato ocorreu na Bahia...

Fiquei impressionado com o expressivo número de pessoas que fizeram contacto, por telefone e pela internet, fazendo comentários sobre meu artigo, dizendo que conheciam casos parecidos e dando parecer a respeito da possibilidade, ou não, de o marido ser indenizado pelo cúmplice do adultério. 

Como prometi, vou dar, a seguir, solução jurídica para a questão.

O cúmplice da esposa adúltera, é óbvio, não está debaixo do dever de fidelidade conjugal. O “ricardão” não tem obrigação de manter a incolumidade da esposa alheia. Pode haver cumplicidade na cama, mas, do ponto de vista jurídico, não há solidariedade entre o parceiro do prazer carnal e a adúltera. 

Em suma: embora tenha praticado algo reprovável – e isso, se sabia que a mulher era comprometida -, o cúmplice do adultério não pratica ato ilícito, não tem o dever de indenizar o marido traído, pela simples razão de o dever jurídico de fidelidade existir apenas entre os cônjuges, e não se estende a terceiro que pratica com um deles o ato sexual.

Entretanto, há sujeitos que sentem um diabólico gosto em divulgar e propalar suas conquistas, gritando como araras roendo tucumã. 

Dignidade, caráter, discrição passam longe desses caras, que, com esse abjeto comportamento, praticam ato ilícito, desmoralizam, ofendem a honra, a dignidade, violam gravemente direito de personalidade do marido enganado, e pode haver reparação pelo dano moral.  

10.10.2009 

Fonte: Publicado no joranl O Liberal - 05.09.2009

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